quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Todo mundo se acha, e no final ninguem se dá bem!!

Eis aqui uma grande obra: "Todo mundo e ninguém". Há cinco séculos em Portugal, Gil Vicente teve a grande ideia de colocar personagens com nome de "todo mundo" e "ninguém".Foi então que o genio dos genios, Carlos Dummond de Andrade adaptou. Que obra esplendia essa que passo. Façam bom proveito.

Carlos Drummond de Andrade

(Auto da Lusitânia, de Gil Vicente)



Ninguém: Tu estás a fim de quê ?

Todo Mundo: A fim de coisas buscar
que não consigo topar.
Mas não desisto, porque
O cara tem de teimar.

Ninguém: Me diz teu nome primeiro.

Todo Mundo: Eu me chamo Todo Mundo
e passo o dia e o ano inteiro correndo atrás de dinheiro,
seja limpo ou seja imundo.

Belzebu: Vale a pena dar ciência
e anotar isto bem, por ser fato verdadeiro:
Que Ninguém tem consciência
e Todo Mundo, dinheiro.

Ninguém: E o que mais procuras, hem?

Todo Mundo: Procuro poder e glória.

Ninguém: Eu cá não vou nessa história.
Só quero virtude...Amém.

Belzebu: Mas o pai não se ilude
e traça: Livro Segundo.
Busca o poder Todo Mundo
e Ninguém busca virtude.

Ninguém: Que desejas mais, sabido?

Todo Mundo: Minha ação elogiada
Em todo e qualquer sentido.

Ninguém: Prefiro ser repreendido
quando der uma mancada.

Belzebu: Aqui deixo por escrito
o que querem, lado a lado:
Todo Mundo ser louvado
e Ninguém levar um pito.

Ninguém: E que mais, amigo meu?

Todo Mundo: Mais a vida. A vida, olé!

Ninguém: A vida? Não sei o que é.
A morte, conheço eu.

Belzebu: Esta agora é muito forte
e guardo para ser lida:
Todo Mundo busca a vida
e Ninguém conhece a morte.

Todo Mundo: Também quero o Paraíso,
mas sem ter que me chatear.

Ninguém: E eu, suando pra pagar
minhas faltas de juízo!

Belzebu: Para que sirva de aviso,
mais uma transa se escreve:
Todo Mundo quer Paraíso
e Ninguém paga o que deve.

Todo Mundo: Eu sou vidrado em tapear,
e mentir nasceu comigo.

Ninguém: A verdade eu sempre digo
sem nunca chantagear.

Belzebu: Boto anúncio na cidade,
deste troço curioso:
Todo Mundo é mentiroso
e Ninguém fala a verdade.

Ninguém: Que mais, bicho?

Todo Mundo: Bajular

Ninguém: Eu cá não jogo confete.

Belzebu: Três mais quatro igual a sete.
O programa sai do ar.
Lero lero lero lero,
curro paco paco paco.
Todo Mundo é puxa-saco
e Ninguém quer ser sincero!

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

no fundo do copo, abraçando uma azeitona

Existem certas pessoas
Que destróem a nossa vida
Pessoas tão boas
que nos animam a continuar

Já não há saída
Nossos corações
Fingem que não sentem a ferida

Nós choramos
Nós rimos também
Pensamos
Que esta tudo bem

Sabemos que são como nós
Mas os chamamos de deuses
Distorcemos os fatos
Nos sentimos sós
Nos humilhamos tantas vezes
Que nos imaginamos como ratos

E eu sendo um rato modesto
Não consigo odiá-lo
E cada vês mais me detesto
Por ser a única coisa que me separa dele
Dele que me destrói
Dele que me renova
E essa humilhação me corrói
Meu coração chora
A razão para
E aumenta ainda mais a nossa tara

Por esses malditos deuses
Que nos transformam em ratos
Benditos deuses dos ratos

Que eu amo tanto...