sábado, 20 de agosto de 2011

3- caderninho azul

Ela olhou pra mim de novo, eu não parei de olhar. Ela sorriu, eu sorri. “Dia treze” ela disse. Eu não sabia o que falar, porque tinha medo de parecer idiota. Eu concordei com a cabeça. Senti que não era o suficiente “é... acredita em azar?” completei medindo bem minhas palavras. “Não...” ela respondeu “só em sorte”. Um silêncio nos seguiu. Eu gostava do silêncio porque eu podia olhar pra ela, mais não gostava porque eu queria escutar a voz dela. E me sentia importante quando ela olhava pra mim. Ia tentar algo arriscado. Algo que excedia todas as minhas expectativas. Um salto mortal em um precipício infinitamente profundo. “Você me passaria seu telefone, por favor?”. Não esperava que ela passasse o telefone dela realmente. E mesmo que sim, eu não ia ligar pra ela, não costumo usar telefones. Não muito. O fato era que eu tentava puxar assunto, e subir um degrau do nível do nosso relacionamento para talvez o início de uma amizade, mais isso era chutar alto. Ela me passou um número de telefone. Que eu anotei com as mãos débeis devido ao movimento do ônibus em minha caderneta azul. Meio preocupado com os pães, meio preocupado com minhas anotações. Infelizmente, o ônibus se aproximava do ponto, e eu sentia meu coração esmilinguir. Era um adeus. Desci do ônibus. Olhei ele sumir na esquina, lá dentro ia embora a coisa mais linda que eu vi na vida. Era como se fosse um sonho. Como se nada na via pudesse ser tão bom quanto escutar a voz dela, e vê-la nos olhos.

Mas graças aos céus, eu tinha uma coisa. Uma coisa que era a prova de sua existência. Uma coisa para me lembrar, nesse gélido inverno, que ela sorriu para mim. Apalpei meu bolso em busca de minha caderneta. Não estava em meu bolso direito, naturalmente, eu sou destro. Troquei os pães de mão. Apalpei o bolso esquerdo. Também não estava lá! Me desesperei. Quase joguei os pães no chão para enfiar as duas mãos nos bolsos. Eu sentei no chão, deixei os pães bem protegidos e procurei em cada bolso interno, em cada fundo de meia, até mesmo dentro da cueca. Não estava em lugar nem um. Eu esqueci no ônibus. Perdida, agora sim, para sempre.

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